04/05/23 Contencioso em Foco

Caso Light – Concessionária de serviço público e a proteção para suspensão de dívidas

A polêmica decisão proferida pela 3ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro foi mantida pelo Tribunal de Justiça

 

O desembargador José Carlos Paes, da 12ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, proferiu decisões monocráticas rejeitando pedidos formulados por gestoras de fundo de investimento, pelo Banco Morgan Stanley S/A  e pelo Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Light visando à suspensão da decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro, a qual, a pedido da Light S/A, Light – Serviços de Eletricidade S/A, Light Energia S/A e Lajes Energia S/A, concedeu tutela provisória a fim de suspender por 30 dias, prorrogáveis por igual período, o vencimento de dívidas da concessionária de energia elétrica, consubstanciadas em debêntures, bônus emitidos no exterior, cédulas de crédito bancário, dentre outros.

Na decisão de 1º grau, o magistrado determinou, ainda, a instauração de um procedimento de mediação com os credores do Grupo Light que tramitará perante o Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – em um procedimento similar àquele que seria observado em uma recuperação judicial.

A decisão fundamentou-se no cenário de dificuldades financeiras relatado pelo Grupo ao postular a medida e, ainda, no caráter essencial dos serviços prestados, concedendo a tutela para evitar, principalmente, o risco de dano à população fluminense usuária dos serviços de energia elétrica.

Dentro de um contexto no qual concessionárias de serviços públicos de energia elétrica são vedadas de se socorrerem do instituto da recuperação judicial (art. 18 da Lei Federal nº 12.767/2012), a decisão prolatada, se mantida definitivamente pelo Poder Judiciário, consubstanciará importantíssimo precedente às concessionárias que se encontram em dificuldades, bem como na contingência de estancar prejuízos em situações de pré-crise financeira, tudo isso ao mesmo tempo em que devem, necessariamente, manter a continuidade da prestação do serviço essencial – que não está sujeita a interrupção.

A medida deferida, além de considerar a essencialidade do serviço prestado, vai ao encontro das normas fundamentais do código processual brasileiro, ao estimular métodos de solução consensual de conflitos, em linha com os parágrafos 2º e 3º do artigo 3º do Código de Processo Civil.

Na hipótese de o procedimento de mediação – determinado na decisão em comento – se mostrar eficaz e auxiliar no reestabelecimento da saúde financeira da concessionária, se evitará, inclusive, eventual intervenção na concessão pela respectiva agência reguladora.

Com a subida da discussão à corte estadual, as decisões proferidas pelo desembargador José Carlos Paes destacam que “por ora, não se vislumbra vedação à instauração do procedimento de mediação entre as partes”, ressaltando o dever de se incentivar a mediação em linha com o art. 20-A da Lei Federal nº 11.101/2005 – que regula, entre outros institutos, o da recuperação judicial. As decisões pontuam, inclusive, que, nos termos do art. 20-B, inciso II, da mencionada lei, admitem-se mediações antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial “em conflitos que envolverem concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial”.

Além disso, as decisões de 2º grau salientam que a vedação à recuperação judicial para as concessionárias de energia elétrica, referida no art. 18 da Lei Federal nº 12.767/2012, “não poderá ser estendida às suas controladoras ou controladas”, que “detêm personalidade jurídicas distintas e patrimônios autônomos”.

De toda a forma, dada a relevância do tema e suas possíveis implicações, além do vultoso valor econômico envolvido – cerca de R$ 11,1 bilhões em obrigações financeiras –, a decisão, ainda provisória, deverá ser acompanhada de perto e provavelmente será alvo de outras insurgências até que eventualmente venha a ser confirmada em decisão final.

Referências:

Tutela Cautelar Antecedente n° 0843430-58.2023.8.19.0001 – 3ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro

Agravo de Instrumento n° 0026608-30.2023.8.19.0000; n° 0027376-53.2023.8.19.0000; n° 0027567-98.2023.8.19.0000 – 12ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do RJ

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