14/07/23 Contencioso em Foco

O status das medidas atípicas no processo de execução

por Thales Romano Coelho

Em processos de execução de obrigações de pagamento, o Poder Judiciário viabiliza à parte Exequente diversos instrumentos para atingir o patrimônio da parte Executada. O credor pode pleitear, por exemplo, penhora de valores em contas bancárias, penhora de percentual do faturamento e inclusão do devedor em cadastros restritivos de crédito.

Entretanto, em casos em que o Exequente enfrenta dificuldades em obter a satisfação do seu crédito, a despeito da utilização das diversas ferramentas judiciais e extrajudiciais à sua disposição, alguns magistrados passaram a autorizar “medidas executivas atípicas”, tais como a imposição de restrições ao direito de dirigir (com a suspensão da CNH) ou de sair do país (com a retenção do passaporte).

Em 2018, a constitucionalidade do dispositivo legal que autoriza essas medidas atípicas (art. 139, IV, do Código de Processo Civil) foi questionada por meio da ação declaratória de inconstitucionalidade nº 5941, sob o fundamento de que direitos constitucionais, como o da liberdade de ir e vir, seriam prejudicados por essas medidas executivas.

Contudo, em 09.02.23, o Supremo Tribunal Federal julgou a ação improcedente, reconhecendo a constitucionalidade do art. 139, IV, do Código de Processo Civil. Segundo o relator, Min. Luiz Fux, a constitucionalidade dessas “medidas executivas atípicas” seria consequência do direito do credor à “efetiva solução do conflito” e da prerrogativa do Poder Judiciário conferir efetividade às suas decisões.

No entanto, ainda que tenha reconhecido a constitucionalidade do referido dispositivo legal, o STF não determinou os critérios para o deferimento dessas medidas, indicando apenas que a possibilidade de elas resultarem em “restrição irrazoável da liberdade do cidadão” deveria ser analisada caso a caso.

No âmbito da justiça trabalhista, por exemplo, o juízo da 7ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, nos autos do cumprimento de sentença 0000161-54.2011.5.01.0007 considerou que os indícios do descumprimento injustificado de um acordo autorizariam a adoção de medidas executivas atípicas, determinando a expedição de ofícios a Netflix, iFood, Uber, Claro, Tim e Vivo para informarem com quais recursos um devedor custeava os serviços prestados por essas empresas.

No âmbito das justiças federal e comum, essa análise, por sua vez, deve acabar centralizada no Superior Tribunal de Justiça, que já afetou dois recursos sobre medidas executivas atípicas à sua Corte Especial em 26.04.23, sob o título de tema repetitivo 1137 (nos termos do Código de Processo Civil — art. 1.036 e seguintes —, isso significa que o julgamento desses recursos afetados resultará em uma tese a ser adotada pelos tribunais de segunda instância).

Ressalta-se que o STJ já se pronunciou favoravelmente a respeito de “medidas atípicas” em outras oportunidades. Por exemplo, no julgamento do REsp 1864190/SP, em 2020, a Terceira Turma do STJ indicou que a utilização das medidas “atípicas” dependia da comprovação do esgotamento das medidas “típicas”.

Em outra ocasião, no julgamento do HC 711.194, impetrado por um devedor contra decisão que determinou o bloqueio de seu passaporte, sagrou-se vencedor o voto da Ministra Nancy Andrighi no sentido de que medidas atípicas “devem ser deferidas e mantidas enquanto conseguirem operar, sobre o devedor, restrições pessoais capazes de incomodar e suficientes para tirá-lo da zona de conforto, especialmente no que se refere aos seus deleites, aos seus banquetes, aos seus prazeres e aos seus luxos, todos bancados pelos credores”.

Destarte, posicionamentos como os citados acima levam a crer que ao julgar o Tema 1137 e estabelecer uma decisão paradigma para os tribunais estaduais e federais, a Corte venha a se debruçar sobre as especificidades dos critérios para o deferimento dessas medidas, aprofundando os posicionamentos já adotados anteriormente.

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